As crianças eram umas pestinhas. Não paravam de gritar e correr pelo corredor do hotel (aliás, não sei de onde veio esse nome, corredor. Que nome mais inadequado. Porque se existe uma coisa que não se deve fazer em um corredor é correr). Uma coisa que me irrita profundamente é criança mal educada. Ainda não tenho filhos, mas prometo que vou me esforçar bastante para não pagar língua: criança que grita e que não tem noção de alteridade me deixa fora do sério. É claro que eu não espero que uma criança de quatro anos saiba o significado de alteridade. Mas não é preciso esperar que ela chegue à adolescência para ensinar a ela que ela não está sozinha no mundo, que ela vive em sociedade e que as outras pessoas merecem respeito.
Naquela tarde de sábado, qualquer pessoa que estivesse compartilhando aquele andar do hotel com a família arruaceira estava impedida de descansar, ler algum livro, estudar ou fazer qualquer coisa que lhe demandasse concentração. As duas crianças gritavam pelo corredor, brincavam de pega-pega, passavam de quarto em quarto reivindicando a atenção de seus familiares, faziam exigências – e tudo isso em altíssimos decibéis. Os adultos também não eram um modelo de comportamento: riam e falavam alto, saíam de seus quartos e ficavam conversando no corredor a cada cinco minutos (qual a necessidade disso??) e não pareciam muito preocupados com os demais hóspedes.
Eu, sinceramente, pensei em sair do meu quarto e pedir silêncio, falar que eles estavam incomodando e que havia outras pessoas no hotel que mereciam respeito. Mas devo confessar que sou um pouco medrosa: fiquei com receio de que, com a chamada de atenção, os meninos se rebelassem e, então, começassem a gritar mais ainda. E, aí, minha intervenção iria por água abaixo, e surtiria justamente o efeito contrário. Eu tenho certeza de que, se fosse a posição contrária (se me chamassem a atenção por um mau comportamento) eu iria ficar pianinho e nunca mais os hóspedes ouviriam um pio meu. Mas sei que muita gente não é assim tão obediente e cordata. Por isso hesitei em me manifestar.
Um pensamento não saía da minha mente: Deus do céu! Nessa hora, onde estão os pais desses meninos? Sim, porque eu tinha visto que os pais estavam ali, em um dos quartos. Em um momento, inclusive, a menina soltou: “a mamãe está dormindo!” (não que ela parecesse preocupada em permitir o descanso da mãe: ela estava apenas prestando uma informação à sua tia). E aí eu pensei: Como uma mãe consegue dormir com esse barulho infernal?
Alguns minutos depois, enquanto eu ainda estava impressionada com a ausência de autoridade dos pais e com a falta de iniciativa para colocar fim àquela situação, chega a mãe à porta de seu quarto e presenteia todos os hóspedes com sua intervenção: parecendo estressada com seus filhos bagunceiros, ela vai ao corredor e, numa atitude de total garbo e elegância, grita com as crianças: Vocês dois: parem de gritar!!!! Parem de correr!!!! Fiquem quietos! E, para finalizar, entra em seu quarto e bate a porta com bastante força. Que comportamento exemplar! E é claro que não adiantou nada: alguns minutos depois os meninos estavam fazendo bagunça no corredor novamente, o que me fez ligar para a recepção do hotel e pedir que tomassem alguma providência para acabar com aquela situação incômoda e perturbadora.
E naquela hora, naturalmente, eu percebi a razão de os meninos serem tão encapetados. Eu tenho uma teoria que talvez não se aplique a 100% dos casos, mas que acho que é bem segura: o filho reproduz o que os pais fazem. Se você é um escandaloso, que só resolve seus problemas no grito, seu filho vai ser um escandaloso também. E de nada adianta querer impor moral e autoridade se rebaixando ao comportamento que se quer reprovar: como uma mãe pretende que seus filhos parem de gritar, se ela se dirige a eles gritando?
Outra coisa que me irrita profundamente é o tipo de repreensão que se resume a comandos imperativos, desprovida de qualquer ensinamento: “Pare de gritar!”, “Não corra!”, “Fale baixo!”, “Não seja bagunceiro!”. Esse tipo de intervenção, em minha opinião, não serve de nada e educa muito pouco. Pode até ser eficaz durante cinco minutos, mas não inculca qualquer bom senso nas crianças. Se o pai simplesmente aborda seu filho com um “pare de gritar!”, talvez (e só talvez) o menino pare de gritar ali e agora. Por outro lado, se o pai ensina a seu filho que vivemos em sociedade, que não somos melhores que ninguém e que não temos o direito de perturbar o descanso e a concentração das outras pessoas, o filho irá introjetar aquele ensinamento e, não só deixará de gritar ali e agora, mas também saberá se comportar e guardar o silêncio em outras situações que o exijam: em bibliotecas, hospitais, na casa de outras pessoas e em sua própria casa, respeitando, por exemplo, o estudo do irmão e o sono dos familiares.
A teoria que levanto é simples, nada sofisticada. Porém, sua aplicação exige que os pais saiam do comodismo e adotem posturas mais firmes, o que nem sempre acontece. De qualquer forma, a primeira coisa que é preciso interiorizar é que aquele ditado que parece batido é, na verdade, um grande ensinamento da sabedoria popular: tal pai, tal filho.